Desigualdade no acesso ao saneamento básico ainda adoece famílias no Brasil
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A expansão do saneamento básico no Brasil ainda não alcança toda a população, deixando crianças e famílias suscetíveis a doenças transmissíveis por água contaminada. Saiba mais
Quando se pensa em saneamento básico, qual é a primeira coisa que vem à cabeça? Água tratada ou coleta de esgoto? As duas respostas estão certas, mas o processo é mais complexo e conta com quatro componentes.
O primeiro e mais importante é a água tratada. Ela abrange a coleta em local adequado e as diversas etapas de tratamento a fim de tornar a água própria para consumo humano.
O esgotamento é o segundo item. Tanto as casas quanto as indústrias devem destinar os seus rejeitos líquidos devidamente. As residências possuem uma rede de coleta que os conduz às estações de tratamento, onde passam por etapas até poderem ser reutilizados ou devolvidos para a natureza. As indústrias, em geral, são responsáveis pelo primeiro procedimento de todos os dejetos líquidos que produz.
O terceiro componente, que muita gente esquece, é a coleta de rejeitos sólidos. Ou seja, a coleta de lixo. Esses resíduos também devem ser recolhidos, tratados e encaminhados para um aterro sanitário. Lá, o processo continua por meio do tratamento do chorume, que pode provocar a contaminação do meio ambiente.
Já o quarto se refere ao destino das águas pluviais, isto é, da água da chuva. Nas cidades, onde os rios são normalmente canalizados e muitos lugares têm se tornado impermeáveis, está cada vez mais difícil escoar a água da chuva adequadamente. Como consequência, temos inundações, contaminação de lençóis freáticos (de onde vem a coleta de água para consumo humano) e também a transmissão de doenças.
Distribuição do saneamento no Brasil é marcada pela desigualdade
O saneamento básico é um direito universal previsto na Constituição e fundamental para garantir a saúde pública. Para que isso se torne realidade no país, em 2020 foi promulgado o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, estabelecendo que todos os municípios brasileiros devem atender 99% da população com abastecimento de água e 90% com esgotamento sanitário até 2033. Em 2024, segundo pesquisa do Instituto Trata Brasil, nenhuma região havia atingido a meta.
O Sudeste é o que mais se aproxima, com 80,89% de atendimento ainda em 2022. Nas regiões Norte, Nordeste e Sul, menos de 50% da população possui acesso à coleta de esgoto. No Norte, apenas 15% contam com esse serviço.
Estudo publicado em agosto de 2023 constatou a relação direta entre os estados com menores índices de acesso à coleta de esgoto e a maior ocorrência de doenças diarreicas agudas, as DDAs. O Pará e o Maranhão foram os mais afetados, com cerca de 217 mil e 128 mil casos anuais, respectivamente.
Mas, além das diferenças regionais, há outro fator importante. Hoje, no Brasil, 93,4% dos domicílios em áreas urbanas possuem acesso à água tratada e 78% têm coleta de esgoto. Esse cenário é completamente diferente nas áreas rurais, onde apenas 32,3% das casas dispõem de acesso à água tratada e menos de 10% contam com escoamento de esgoto pela rede geral. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad, de 2023.
“No estado de São Paulo, que é o mais urbano do Brasil, nós temos 96% da população morando em área urbana e 4% em área rural. Então, parte dessa população rural tem acesso à água de boa qualidade, mas não necessariamente tratada”, explica Gonzalo Vecina, médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP).
Isso porque existem outros meios de abastecimento de água a essas pessoas, como poços artesianos, poços freáticos, fontes, nascentes, caminhão-pipa, entre outros. Alguns deles podem ser tratados, mas, em sua maioria, não são considerados seguros.
Doenças mais comuns associadas à falta de saneamento
Ainda que longe do ideal, o panorama do saneamento básico no Brasil vem melhorando. Em 2000, a porcentagem da população que morava em domicílios conectados à rede de coleta de esgoto, por exemplo, era de 44,4%. Em 2010, subiu para 52,8% e, de acordo com o último Censo, chegou a 62,5% em 2022.
“Hoje, é diferente do passado. O que nós tínhamos antigamente, que eram as doenças infecciosas de veiculação hídrica, hoje praticamente existe mais nas cidades. O que a gente tem, de vez em quando, são surtos de algum tipo de doença, geralmente a partir de creches. As crianças acabam, de alguma forma, se infectando e levam isso para creches, escolas etc.”, explica o médico sanitarista.
Quando diz “doenças de veiculação hídrica”, o especialista se refere às principais enfermidades cuja transmissão está diretamente relacionada à falta de saneamento básico. Elas podem ser causadas pelo consumo de água ou alimentos contaminados ou pelo contato prolongado com água suja. São elas:
Cólera: resulta em diarreia aguda e desidratação extrema;
Giardíase e amebíase: desencadeiam diarreia, cólicas e desnutrição;
Febre tifoide: leva à febre prolongada, dor abdominal e fraqueza;
Helmintíases: resultam em anemia e desnutrição, e podem atrasar o crescimento infantil;
Infecções de pele e micoses: provocam lesões na pele, coceira e infecções secundárias.
As crianças são as mais afetadas, com consequências para a vida adulta
Por estarem em contato direto com o chão, objetos sujos ou águas de fontes duvidosas e também acostumadas a colocar mãos e coisas na boca, as crianças são muito acometidas pelas doenças descritas, aumentando o risco de contaminação.
“Elas não tiveram essas doenças, né? Ainda não têm imunidade que as proteja. São o que a gente chama de ‘suscetíveis’. Então, é um terreno fértil para o espalhamento de doenças infecciosas e contagiosas”, acrescenta o dr. Gonzalo.
Os pequenos também tendem a evoluir para quadros mais graves, já que a perda de líquidos em episódios de diarreia ou vômito é proporcionalmente maior em relação ao peso, o que pode levar à desidratação grave, insuficiência renal e até a morte. Levantamento do Instituto Trata Brasil mostra que mais da metade das internações por diarreia associada à falta de saneamento acontece em pacientes de até 5 anos. Infecções como essas, de forma recorrente, interferem no crescimento físico, no desempenho escolar e no desenvolvimento cognitivo.
Na população geral, de 2009 a 2018, a taxa de internações por doenças associadas à deficiência de saneamento caiu de 184,7 para 65,6 por 100 mil habitantes, de acordo com o Sistema de Informações Hospitalares do SUS. Ainda assim, em 2022, segundo dados do Data SUS, foram cerca de 191 mil internações e mais de 2 mil mortes. Considerando que o custo da internação por infecção gastrointestinal gira em torno de R$ 355,71 por paciente no SUS, o gasto para os cofres públicos naquele ano pode ter chegado a mais de R$ 65 milhões.
Na vida adulta, 14 milhões de pessoas são afastadas do trabalho anualmente por diarreia ou vômito, ficando afastadas de suas atividades por cerca de três dias, também segundo o Instituto Trata Brasil. Isso as torna vulneráveis a demissões e situações socioeconômicas ainda mais precárias, impactando o seu bem-estar e o de suas famílias como um todo.
Por outro lado, informações apuradas pelo Instituto indicam que o esforço de expandir o alcance do saneamento básico no Brasil poderia criar 50 mil postos de trabalho e R$ 7,2 bilhões de reais em salários. Somente com a coleta universal de esgoto, estima-se que 74,6 mil internações poderiam ser evitadas, prevenindo muitas das mortes que ainda acontecem no país.
Conteúdo produzido em parceria com Saneamento Salva.
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Quando se pensa em saneamento básico, qual é a primeira coisa que vem à cabeça? Água tratada ou coleta de esgoto? As duas respostas estão certas, mas o processo é mais complexo e conta com quatro componentes.
O primeiro e mais importante é a água tratada. Ela abrange a coleta em local adequado e as diversas etapas de tratamento a fim de tornar a água própria para consumo humano.
O esgotamento é o segundo item. Tanto as casas quanto as indústrias devem destinar os seus rejeitos líquidos devidamente. As residências possuem uma rede de coleta que os conduz às estações de tratamento, onde passam por etapas até poderem ser reutilizados ou devolvidos para a natureza. As indústrias, em geral, são responsáveis pelo primeiro procedimento de todos os dejetos líquidos que produz.
O terceiro componente, que muita gente esquece, é a coleta de rejeitos sólidos. Ou seja, a coleta de lixo. Esses resíduos também devem ser recolhidos, tratados e encaminhados para um aterro sanitário. Lá, o processo continua por meio do tratamento do chorume, que pode provocar a contaminação do meio ambiente.
Já o quarto se refere ao destino das águas pluviais, isto é, da água da chuva. Nas cidades, onde os rios são normalmente canalizados e muitos lugares têm se tornado impermeáveis, está cada vez mais difícil escoar a água da chuva adequadamente. Como consequência, temos inundações, contaminação de lençóis freáticos (de onde vem a coleta de água para consumo humano) e também a transmissão de doenças.
Distribuição do saneamento no Brasil é marcada pela desigualdade
O saneamento básico é um direito universal previsto na Constituição e fundamental para garantir a saúde pública. Para que isso se torne realidade no país, em 2020 foi promulgado o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, estabelecendo que todos os municípios brasileiros devem atender 99% da população com abastecimento de água e 90% com esgotamento sanitário até 2033. Em 2024, segundo pesquisa do Instituto Trata Brasil, nenhuma região havia atingido a meta.
O Sudeste é o que mais se aproxima, com 80,89% de atendimento ainda em 2022. Nas regiões Norte, Nordeste e Sul, menos de 50% da população possui acesso à coleta de esgoto. No Norte, apenas 15% contam com esse serviço.
Estudo publicado em agosto de 2023 constatou a relação direta entre os estados com menores índices de acesso à coleta de esgoto e a maior ocorrência de doenças diarreicas agudas, as DDAs. O Pará e o Maranhão foram os mais afetados, com cerca de 217 mil e 128 mil casos anuais, respectivamente.
Mas, além das diferenças regionais, há outro fator importante. Hoje, no Brasil, 93,4% dos domicílios em áreas urbanas possuem acesso à água tratada e 78% têm coleta de esgoto. Esse cenário é completamente diferente nas áreas rurais, onde apenas 32,3% das casas dispõem de acesso à água tratada e menos de 10% contam com escoamento de esgoto pela rede geral. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad, de 2023.
“No estado de São Paulo, que é o mais urbano do Brasil, nós temos 96% da população morando em área urbana e 4% em área rural. Então, parte dessa população rural tem acesso à água de boa qualidade, mas não necessariamente tratada”, explica Gonzalo Vecina, médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP).
Isso porque existem outros meios de abastecimento de água a essas pessoas, como poços artesianos, poços freáticos, fontes, nascentes, caminhão-pipa, entre outros. Alguns deles podem ser tratados, mas, em sua maioria, não são considerados seguros.
Doenças mais comuns associadas à falta de saneamento
Ainda que longe do ideal, o panorama do saneamento básico no Brasil vem melhorando. Em 2000, a porcentagem da população que morava em domicílios conectados à rede de coleta de esgoto, por exemplo, era de 44,4%. Em 2010, subiu para 52,8% e, de acordo com o último Censo, chegou a 62,5% em 2022.
“Hoje, é diferente do passado. O que nós tínhamos antigamente, que eram as doenças infecciosas de veiculação hídrica, hoje praticamente existe mais nas cidades. O que a gente tem, de vez em quando, são surtos de algum tipo de doença, geralmente a partir de creches. As crianças acabam, de alguma forma, se infectando e levam isso para creches, escolas etc.”, explica o médico sanitarista.
Quando diz “doenças de veiculação hídrica”, o especialista se refere às principais enfermidades cuja transmissão está diretamente relacionada à falta de saneamento básico. Elas podem ser causadas pelo consumo de água ou alimentos contaminados ou pelo contato prolongado com água suja. São elas:
Cólera: resulta em diarreia aguda e desidratação extrema;
Giardíase e amebíase: desencadeiam diarreia, cólicas e desnutrição;
Febre tifoide: leva à febre prolongada, dor abdominal e fraqueza;
Helmintíases: resultam em anemia e desnutrição, e podem atrasar o crescimento infantil;
Infecções de pele e micoses: provocam lesões na pele, coceira e infecções secundárias.
As crianças são as mais afetadas, com consequências para a vida adulta
Por estarem em contato direto com o chão, objetos sujos ou águas de fontes duvidosas e também acostumadas a colocar mãos e coisas na boca, as crianças são muito acometidas pelas doenças descritas, aumentando o risco de contaminação.
“Elas não tiveram essas doenças, né? Ainda não têm imunidade que as proteja. São o que a gente chama de ‘suscetíveis’. Então, é um terreno fértil para o espalhamento de doenças infecciosas e contagiosas”, acrescenta o dr. Gonzalo.
Os pequenos também tendem a evoluir para quadros mais graves, já que a perda de líquidos em episódios de diarreia ou vômito é proporcionalmente maior em relação ao peso, o que pode levar à desidratação grave, insuficiência renal e até a morte. Levantamento do Instituto Trata Brasil mostra que mais da metade das internações por diarreia associada à falta de saneamento acontece em pacientes de até 5 anos. Infecções como essas, de forma recorrente, interferem no crescimento físico, no desempenho escolar e no desenvolvimento cognitivo.
Na população geral, de 2009 a 2018, a taxa de internações por doenças associadas à deficiência de saneamento caiu de 184,7 para 65,6 por 100 mil habitantes, de acordo com o Sistema de Informações Hospitalares do SUS. Ainda assim, em 2022, segundo dados do Data SUS, foram cerca de 191 mil internações e mais de 2 mil mortes. Considerando que o custo da internação por infecção gastrointestinal gira em torno de R$ 355,71 por paciente no SUS, o gasto para os cofres públicos naquele ano pode ter chegado a mais de R$ 65 milhões.
Na vida adulta, 14 milhões de pessoas são afastadas do trabalho anualmente por diarreia ou vômito, ficando afastadas de suas atividades por cerca de três dias, também segundo o Instituto Trata Brasil. Isso as torna vulneráveis a demissões e situações socioeconômicas ainda mais precárias, impactando o seu bem-estar e o de suas famílias como um todo.
Por outro lado, informações apuradas pelo Instituto indicam que o esforço de expandir o alcance do saneamento básico no Brasil poderia criar 50 mil postos de trabalho e R$ 7,2 bilhões de reais em salários. Somente com a coleta universal de esgoto, estima-se que 74,6 mil internações poderiam ser evitadas, prevenindo muitas das mortes que ainda acontecem no país.
Conteúdo produzido em parceria com Saneamento Salva.
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